
TODOS IGUAIS, TODOS DIFERENTES
Eu gosto de peras e gosto de as comer com casca. Não há muito tempo, depois de morder distraidamente um magnífico exemplar, descobri na boca uma textura que não esperava: uma pesquisa mais aprofundada revelou um selo verdinho a dizer "Rocha do Oeste DOP". Junto com o gosto pouco recomendável do autocolante chegou- me também um sabor reconfortante a profissionalismo. Alguém com evidente orgulho naquele produto fez um esforço para lhe dar uma identidade e assegurar-me a mim, consumidor, a sua origem e a sua qualidade. Subitamente já não estava a comer uma simples pera. Estava a comer uma Pera Rocha do Oeste, um produto com denominação de origem protegida, único no mundo, selecionado cuidadosamente e com uma reputação a proteger. Aquele autocolante realizou o passe de mágica: transformou uma mercadoria numa marca e mudou para melhor a minha perceção do produto. Os autocolantes nas frutas não são novidade. Há já muitos anos que nos habituámos a ver as bananas, as mangas e os kiwis decorados com autocolantes que nos asseguram a sua origem em termos de produtor e de país. Às vezes apenas o país, país como marca, sinónimo de qualidade e garantia de origem: banana do Equador, quiwi da Nova Zelândia, manga do Brasil. Regiões e produtores que levam a sério as suas exportações, percebendo que cada polpa doce e sumarenta é um embaixador do país e da empresa junto a um consumidor do outro lado do planeta, e que o acúmulo de boas experiências vai ditar a preferência pela marca e a repetição de compra no futuro. E o que é verdade para as exportações, ainda o é mais para os mercados locais, onde a informação que rodeia uma marca é invariavelmente mais rica do que um simples autocolante, rótulo ou embalagem podem sugerir. Basta pensar no que as palavras Alentejo ou Douro no dorso de uma garrafa de vinho significam para um português comum e o que podem traduzir para um jovem consumidor emergente numa loja de Pequim. É chinês, diríamos nós. É português, diria ele. E é por isso que a construção de uma marca se deve rodear de infinitos cuidados e incansáveis esforços para transmitir uma imagem fiel, completa, atraente e diferenciadora do produto que representa, ao público a quem pretende vender.
Mas afinal o que é exatamente uma marca? Para a maior parte das pessoas é apenas um nome, geralmente associado a um símbolo, usado para vender produtos ou serviços, diferenciando-os da concorrência. Mas se nos debruçarmos um pouco mais sobre o assunto, percebemos imediatamente que uma marca faz muito mais do que isso. Uma marca forte tem a capacidade de conquistar uma maior parcela de mercado, abrir novas áreas de negócio, atrair e manter colaboradores de qualidade e, com tudo isso, criar valor para os acionistas da empresa. Uma marca forte é, na verdade, a alavanca e o suporte do próprio negócio, seja ele qual for. Por muito que custe ao setor da produção, a verdade é que o produto deixou há muito tempo de estar no centro das atenções do consumidor, para ser substituído pela marca. Não quer isto dizer que uma boa marca consegue camuflar um mau produto durante muito tempo (embora haja exemplos), mas sim que os produtos são, cada vez mais, mercadorias indiferenciadas. No passado, uma patente industrial assegurava durante um período de tempo razoável alguma exclusividade de mercado. Na sociedade de informação em que vivemos hoje, a mesma tecnologia está cada vez mais, e mais rapidamente, acessível a um maior número de empresas, tornando quase impossível uma efetiva diferenciação de produtos. Além disso, um produto pode sempre ser copiado, ao passo que uma marca é por definição única. Stephen King, profissional da multinacional de publicidade WPP, definiu de forma brilhante e sintética este axioma: "Um produto é algo que é feito numa fábrica; uma marca é algo que é comprado por um consumidor." E se esta afirmação coloca o consumidor no centro de decisão do sucesso ou insucesso de qualquer empresa, a verdade é que a responsabilidade dessa decisão está inteiramente do lado da empresa. Pela simples razão de que a marca é um espelho fiel da cultura, da estratégia e das decisões da empresa. Tudo o que a empresa faz, seja dentro de portas no desenvolvimento do seu produto e na gestão da empresa, seja na rua, na sua relação com os clientes e com o mercado, tem o seu impacto final na marca e na forma como consumidores, empregados, acionistas e parceiros de negócio olham para ela, muitas vezes de forma inconsciente. E como a marca não é um bem tangível sobre o qual as empresas podem exercer um controle direto - ela existe apenas na cabeça das pessoas - é frequentemente muito difícil interferir, com rapidez e eficácia, na perceção que os diferentes públicos têm dela.
A BP, multinacional petrolífera que inteligentemente começou em 2000 a mudar a orientação estratégica do negócio do petróleo para o da energia, mais amplo, mais ecológico, mais positivo, gastou 10 anos e milhões de dolares em comunicação para mudar o significado da sua sigla de British Petroleum para Beyond Petroleum. Em 2010, um acidente numa das suas plataformas petrolíferas no Golfo do México causou a maior tragédia ecológica da história dos EUA e já custou à empresa vários milhares de milhões de dolares só em multas e indemnizações. O custo para a marca, no entanto, é infinitamente superior. Serão necessários muitos anos até que a sigla BP comece novamente a significar energia limpa e fiável na cabeça dos consumidores e na opinião da sociedade. Porque isto das marcas é como um nome honrado: leva uma vida inteira a construir e um minuto a destruir. Mas se as ameaças são muitas, as vantagens de uma marca forte são ainda mais. E no próximo número vamos começar a conhecê-las.